Ciro no JN: colunistas comentam entrevista do candidato do PDT à Presidência da República
O Jornal Nacional entrevistou ao vivo nesta terça-feira (23) Ciro Gomes (PDT), candidato à Presidência da República. Na análise de colunistas do g1 e da GloboNews, ele adotou um tom mais ameno no enfrentamento aos seus principais adversários na corrida eleitoral – Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) –, a quem vinha criticando duramente desde a pré-campanha.
Além disso, analisam, o pedetista buscou defender de forma “consistente” seu programa de governo e “se conectar” com o eleitorado, mas “valorizou mais a tecnicidade” do discurso, com linguagem avaliada como “muito elaborada”. Na visão deles, um dos grandes obstáculos de Ciro seria a polarização em torno de “dois nomes muito fortes”, que poderia ser fatal para as intenções do candidato de avançar ao segundo turno.
Ciro Gomes foi o segundo sabatinado na série de entrevistas ao JN conduzida por William Bonner e Renata Vasconcellos. A estreia ocorreu nesta segunda-feira (22), com Jair Bolsonaro. O presidente, que disputa a reeleição, repetiu mentira sobre urnas eletrônicas, disse que aceitará o resultado das eleições “desde que sejam limpas e transparentes” e defendeu aliança com o Centrão.
Os próximos entrevistados vão ser Lula, nesta quinta-feira (25), e Simone Tebet (MDB), nesta sexta-feira (26).
Monica Waldvogel (Jornalista)
“A primeira característica de Ciro, quando se pensa em Ciro Gomes, é justamente a retórica agressiva, esquentada que ele tem. É quase que impossível dissociá-lo desse tipo de performance, do discurso dele. E, de fato, ele é muito duro. Ele é muito agressivo, e às vezes até insultuoso na relação dele tanto com o Bolsonaro quanto com o Lula. Então, a pergunta [feita durante a entrevista] foi entrevista, porque diz assim: ‘O senhor quer pacificar, o senhor quer unificar, e está indo frontalmente contra o desejo de mais de 70% dos brasileiros, que já revelaram suas preferências’. Mas, de alguma maneira, ele não tem muita escapatória. Porque, se ele [Ciro] quer ser alternativa, ele precisa de fato enfrentar esses dois adversários [Lula e Bolsonaro]. A dúvida sempre, em relação ao Ciro, é se a forma é a mais adequada.
“Com relação ao PT, ele é um político com uma mágoa muito grande. […] Ele não supera essa mágoa. Mas também não pode flertar, de modo algum, com Bolsonaro, muito menos com seu eleitorado [bolsonarista]. Então, ele [Ciro] fica bastante espremido. E essa é a grande dificuldade que ele tem para passar a sua mensagem. Mensagem essa que é muito elaborada, muito técnica.”
“De fato, ele se preparou muito para esta campanha, é inegável. Ele tem respostas para uma enormidade de problemas brasileiros. […] Ele, de certa forma, dividiu bem esses assuntos e foi mandando as mensagens que ele queria durante a entrevista. A entrevista foi a grande chance, porque ele vai ter menos tempo de TV que os outros candidatos. […] Ele tentou compactar em grandes temas, em títulos, ao dizer como ele pretende governar. […] E, de fato, passar tanto conteúdo preparado durante tanto tempo, para a maior parte da população, é uma tarefa bem difícil.”
Mauro Paulino (Sociólogo de formação, ex-Diretor Geral do Datafolha, Comentarista Político)
“Ciro desde o início apostou numa estratégia de permanecer numa posição totalmente contra, frontalmente Lula e contra Bolsonaro. Ele apostou nesse caminho. E, hoje, num tom mais ameno, parece que os candidatos vêm para o Jornal Nacional para um tom que não seja muito agressivo… E ele passa uma impressão de que está se controlando. Então, ao apostar nesse nicho que ele identificou no início da campanha, ele acaba buscando cerca de 10% do eleitorado, que são os eleitores que rejeitam ao mesmo tempo o Lula e o Bolsonaro.”
“Ao atacar os dois candidatos mais populares, e atacar frontalmente Lula com um discurso muito agressivo até aqui, […] ele acaba restringindo muito o campo de atuação dele. Ao mesmo tempo, na entrevista ele valorizou mais a tecnicidade. Ele foi bastante fluente, como sempre, na defesa do seu programa e na forma de apresentar esse programa, de um jeito muito consistente, mas que dificulta que ele atinja os eleitores que de fato precisam ser atingidos e que decidem a eleição. Que são aqueles mais pobres e, por consequência, menos escolarizados. O discurso precisa atingir mais diretamente esses segmentos, para que o candidato tenha chance.”
Merval Pereira (Jornalista, escritor brasileiro e também membro da academia de letras)
“Eu acho que o Ciro ficou sem espaço, porque, no começo da campanha, atacou os dois [Lula e Bolsonaro], achando que com isso iria pegar o eleitorado da chamada terceira via, que, naquela altura, era vista como 30%. [do eleitorado]. […] E não foi isso que aconteceu. À medida que a campanha foi avançando, os eleitores foram indo para o Lula ou para o Bolsonaro. E o centro, como em 2018, ficou esmagado por essas duas forças extremas. E ele [Ciro] perdeu o espaço dele. Isso é, inclusive, porque na esquerda ele perdeu muito com esse ataque muito agressivo ao Lula.”
“Eu acho que hoje ele foi muito bem… Pode ser que o Ciro possa aumentar o seu eleitorado em cima dos outros candidatos, especialmente a [Simone] Tebet [MDB], que é menos conhecida. Mas acho que dificilmente ele terá condições de tirar o Bolsonaro do segundo turno. Acho uma missão impossível a essa altura do campeonato. Acho que ele [Ciro] demorou muito a encontrar o tom certo. Acho que o tom hoje da entrevista foi o tom correto para ele. Mas acho que ele não tem mais tempo para recuperar esse eleitorado.”
Ana Flor (Ana Flor é palestrante, jornalista da TV Globo, comentarista da GloboNews e colunista do portal G1)
“Ciro, apesar de também ser muito conhecido, está entre dois nomes que têm um impacto popular muito grande. Essa é a grande barreira. […] Apesar de essa entrevista ter sido o momento em que ele consegue se conectar com quem está assistindo […], ele tenta dizer: ‘Me dê uma chance’. E apresenta propostas. Mas, neste momento, o próprio fato de o presidente Bolsonaro estar reagindo e estar crescendo é uma péssima notícia para o Ciro. […]”
“Ele não tem outra opção senão pregar o fim da polarização, dizer que o Lula e o Bolsonaro não vão pacificar o país e trazer um tom muito mais tranquilo, uma nova versão. Mas ele, dificilmente, vai conseguir transpor o momento… […] Agora, ele utilizou muito bem o espaço de hoje. Fez propostas e se conectou com o eleitor. Mas a polarização nesta corrida está dada, porque os dois nomes principais são muito fortes. E, aí, isso para Ciro pode ser fatal mesmo.”